Com o acirramento da concorrência, a ascensão econômica das camadas mais pobres, que ganham poder de compra, e a dificuldade de se trabalhar com preços competitivos, nada melhor do que investir em serviços para atrair clientes e acompanhar a evolução do mercado
Há algum tempo, a oferta de serviços deixou de ser atividade complementar à venda de produtos e se tornou ferramenta para o sucesso de muitas empresas do ramo supermercadista. Além de conveniência, palavra de ordem da vida moderna e pra lá de recorrente no setor, mudanças socioeconômicas e mercadológicas passaram a exercer peso importante sobre o aumento expressivo desse tipo de demanda.
“Estamos num cenário extremamente competitivo, em que é difícil se destacar somente pelo preço. Pequenos e médios supermercadistas trabalham com valores muito semelhantes aos de seus concorrentes diretos, de seus respectivos portes”, ressaltou o coordenador do curso de pós-graduação em administração de empresas focadas no mercado de varejo e franquias da Fundação Armando Álvares Penteado (Faap), Antônio Sá.
Outro fator relevante, segundo o docente, é a expressividade da classe C no mercado de consumo. Essa população teve importante ganho de renda nos últimos anos e, consequentemente, passou a adquirir volume muito maior de bens e serviços. “Com isso, tornou-se mais exigente e passou a querer regalias no momento da compra”, destacou.
Acesso
Os supermercados se transformaram, assim, num pólo multifacetado. Comercializam de tudo para fisgar compradores em ascensão econômica,driblar a concorrência e amenizar a dificuldade em se diferenciar pelo preço.
No entanto, segundo o professor da Faap, o supermercadista precisa ter uma estratégia muito clara sobre a proposta de valor que deseja oferecer aos compradores. No Grupo Pão de Açúcar, segundo o diretor de operações João Edson Gravata, agregar serviços faz parte do DNA da empresa. Vai além de uma alternativa de se diferenciar, com o claro objetivo de proporcionar experiência diferenciada de compra ao cliente.
Exemplo é a mais nova loja da marca Pão de Açúcar, localizada no bairro Panamby, zona Sul de São Paulo (SP). A unidade traz bom portifólio de serviços, como atendente de vinhos e queijos, para facilitar a escolha do consumidor com informações dos produtos, dicas de harmonização e degustação; consultora de clientes, preparadas para apresentar o mix de produtos e serviços e dar dicas de como montar cardápios para diversas ocasiões; encomenda para jantares, entrega em domicílio, pedidos antecipados de carnes por telefone e, em breve, o Personal Shop.
Trata-se de um aparelho, já em funcionamento na unidade do Pão de Açúcar do Shopping Iguatemi, em São Paulo, com o qual o cliente pode selecionar e registrar produtos, verificar o valor comprado, consultar dicas, receitas e promoções, encontrar itens por meio de um GPS integrado e optar pelo recebimento das compras em casa.
Atendimento
A oferta de serviços pode ser feita, portanto, em diversas frentes, com equipamentos e atendimento, como é o caso do Pão de Açúcar e também do Prezunic, do Rio de Janeiro. Na rede, dar toda a atenção aos clientes é prioridade. Os funcionários são preparados para atendê-los e não raramente param seus afazeres para auxiliá-los em relação a qualquer dúvida ou problema que tiverem.
Além disso, para proporcionar experiência agradável de compra, todos os dias, desde a inauguração da primeira unidade, a empresa prepara café da manhã completo, com direito a suco, biscoito, bolo e frutas. Durante todo o dia, o cliente tem à disposição água gelada e café fresco, servido por uma promotora.
O esforço dispensado inquestionavelmente tem dado boas recompensas à rede carioca. Fundada em 2002, tem 30 lojas e, em apenas oito anos, já detém a sétima posição entre as 500 participantes do último Ranking Abras, divulgado em abril por SuperHiper.
O Sonda, com 24 lojas e o 13º lugar no Ranking, também sabe da importância desse tipo de abordagem. Em seu mais novo supermercado, o Sonda Pompéia, em São Paulo (SP), que demandou investimento de R$ 70 milhões, o atendente José Firmino Nere tira dúvidas sobre produtos, serviços, serve mesas, enfim, faz tudo para deixar o cliente o mais satisfeito possível. “Realizo atendimento para que ele saia com boa impressão da loja”, declarou.
Nere está há 15 anos na empresa e é muito conhecido na região, o que facilita a realização do seu trabalho. Atuou por anos na peixaria de outra loja do Sonda, próxima da que está atualmente, e procurava sempre superar as expectativas do frequentador. “Passava algo a mais, dava sugestões quando via que estava indeciso, procurava orientar sobre receitas, enfim, dava a volta e ficava do lado de fora do balcão para conversar com ele”, contou.
Outras possibilidades
A oferta de serviços pode se dar de outras formas, por meio de produtos (oferta de pratos prontos, por exemplo) e no ambiente físico do supermercado. Nesse caso, o Prezunic projetou o layout de suas lojas de acordo com o interesse dos clientes, para facilitar o momento de compra deles. Outra alternativa é disponibilizar, além dos produtos comumente vendidos, galeria com lavanderia, revelação de fotos, casa lotérica, entre outros estabelecimentos comerciais.
“Temos vários supermercados com galerias, que têm de 10 a 50 lojas, como bancas de jornal, drogaria, papelaria, revelação de fotos e até mesmo grandes lojas de roupas e eletrodomésticos. O objetivo é apoiar o consumidor e prestar a ele serviços de primeira necessidade”, afirmou o diretor geral, Genival Bezerra.
Outras empresas do setor, como a rede Carrefour, também buscam oferecer mais do que a venda de itens básicos para fidelizar o tão disputado e cada vez mais infiel comprador. Recentemente, a multinacional europeia investiu R$ 20 milhões na abertura de 100 lojas voltadas à prestação de serviços digitais, como revelação instantânea e montagem de livros de fotos, os chamados photobooks.
O Carrefour conta, hoje, com esse serviço em 77 unidades e planeja ampliar para toda a rede, o que inclui as bandeiras Hiper, Bairro e Express, até 2011. Isso sem contar que no primeiro semestre desse ano abriu 30 unidades, que demandaram investimentos da ordem de R$ 6 milhões.
Mas é claro que o número significativo de câmeras digitais e de aparelhos celulares entre os brasileiros motivou aporte milionário nesse ramo de negócio. Segundo dados de mercado divulgados pela varejista, apenas 25% das fotografias tiradas no País são reveladas. Por isso, há muito espaço para crescer e o Carrefour está de olho nesse segmento.
Essa expansão faz parte da estratégia mundial do grupo de ser reconhecido pelo cliente como marca solução. Com esse objetivo, procura promover ações integradas com os outros negócios da empresa, como os postos de combustível, nos quais a dinâmica promocional é “Abasteça e ganhe desconto na revelação de suas fotos”.
Nas agências de turismo, o cliente compra um pacote e ganha um álbum personalizado com as fotos tiradas na viagem. Aliás, há alguns dias o Carrefour e a Caixa Econômica Federal anunciaram parceria que permite o parcelamento de pacotes em até 24 vezes pelo Crediário Caixa Fácil.
Lazer
A rede Savegnago, do interior paulista, é mais uma que aposta em serviços, o que mostra que esse tipo de prática já ultrapassou os limites dos grandes centros urbanos. Em uma das lojas do grupo, em Ribeirão Preto, os clientes podem revelar fotos e aproveitar para ir ao cabeleireiro, comprar livros e ainda contar com outros sete estabelecimentos comerciais em operação no local.
“Cada vez com os dias mais corridos, as pessoas precisam ter em um mesmo lugar opções de compra e lazer”, afirmou o diretor superintendente da rede, Sebastião Edson Savegnago, o Chalim.
Já na loja de Sertãozinho, município vizinho, o frequentador se depara com uma praça de alimentação e duas salas de cinema, as únicas da cidade. “A loja tem movimento muito intenso, pois além da ampla área de vendas, que tem 2.218 m2, o cinema atrai todos os dias um grande público para a unidade”, diz Chalim.
Porém, além do cinema, para proporcionar qualidade de vida aos clientes o Savegnago mantém, desde 2005, o Programa Ginástica Matinal, implantado em 13 de suas 21 lojas, inclusive na filial de Sertãozinho. O projeto consiste na oferta de três aulas semanais gratuitas de exercícios físicos, ministradas por profissionais de educação física.
Na mesma linha de atuação encontra-se o Programa Mexa-se de Saúde e Qualidade de Vida, da paulista Coop. A ação é parecida, são duas aulas de ginástica semanais coordenadas por profissionais da mesma área.
A rede também organiza, desde 1998, palestras gratuitas com o intuito de propiciar formação e informação aos seus mais de 1,5 milhão de cooperados. São cerca de 100 palestras mensais sobre temas variados, como saúde, beleza, culinária e artesanato. “O projeto é muito bem aceito, tanto que conta com a participação de aproximadamente três mil pessoas todos os meses”, declarou o gerente de comunicação social, Edmilson Sena da Silva.
No espírito cooperativista, também sem fins lucrativos, a rede conta com um fundo de auxílio funeral, destinado aos associados que perderem algum dependente ou mesmo à família do cooperado que venha a falecer.
Mas não para por aí. A empresa tem drogarias, entrega em domicílio, recarga de celulares e até mesmo venda de tíquete gás nos check-outs das lojas. Ou seja, o comprador adquire esse vale e, quando desejar, liga para a distribuidora de gás conveniada, solicita um botijão e repassa o tíquete ao funcionário no momento da entrega.
Em meio a tantas opções, fica difícil o consumidor não se acostumar com a comodidade de contar com inúmeros serviços dentro de um mesmo lugar e a passar a exigi-los em empresas de todos os portes e localizações, já que a concorrência é forte e ele está muito mais exigente.
Todavia, é preciso escolher os serviços certos, de acordo com a necessidade de cada público. Para isso, é indicada a realização de pesquisas. “Grandes empresas tem dinheiro para realizar estudos detalhados, mas se não há verba suficiente, a melhor alternativa é se aproximar do cliente, abrindo canais como serviços de atendimento, cupons e até mesmo elaborar questionários simples, com duas ou três perguntas sobre o tema”, alertou Antônio Sá.
Fonte: Revista SuperHiper, por Margareth Meza